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intervalo poético

Creio já ter postado esses versos. Mas faz frio, São Paulo parece calada e estou aqui procurando alguns arquivos em meu micro. Ao menos um achei pertinente. Deixo abaixo:

CRUZAMENTO

O sinal vermelho fecha o cruzamento.
Ele brilha como se fosse uma sirene.

Serão 30 segundos de trabalho.
De dentro dos carros, verão um menino

bailarino,
sob a luz dos faróis.

Com as mãos levanta a blusa
e gira o corpo
em torno do próprio eixo.

A cintura nua mostra a pele negra
de quem tem 10 primaveras
e não carrega armas.

Ele apenas segura alguns limões
que tenta jogar aos céus.

Mas tem medo, lhe falta equilíbrio.
Arremessa um de cada vez, sem jeito.
Arrancaria risos, se não fosse noite, se não estivesse escuro.

Curva o corpo e se despede antes da luz verde.
Os falsos malabarismos rendem poucas moedas,
mas elas parecem bastar.

O espetáculo de toda uma noite
pode render um sono tranqüilo
ou uma longa viagem.

Vida louca
Nestas esquinas, o equilíbrio paulistano
parece ainda mais aparente.

Uma noite triste

O homem se levanta.
Encontra diante de si o limite e a raiva
e os deixa explodir, unidos,
como gritos na madrugada

depois se cala e adormece
mastigando o medo.
O homem se deita
embalado em pesadelos.

Nuvens esferográficas

Quero apenas
minha caneta de volta.
Dourada.
Trazida por mãos morenas,
cheias de mistério e de vida.

Mas as luzes que agora vemos
são reflexos passados.

Quero apenas o que pertence ao infinito.

A letra esculpida com nosso sacramento.

Objeto de metal, ouro e tinta.
Ah, como eu quero minha caneta de volta,
por tuas mãos.

Quem sabe ela não me contaria suas verdades
para invadir de certezas
o ar paulistano
carente de verdades
e de nuvens esferográficas.

Viver na metrópole

Vale lembrar Drummond.
Itabira é apenas uma fotografia na parede. Mas como dói!”.

Fogo

Fui lá fora comprar cigarros.
Parece que já se passou um século.

Sobrou debaixo de muito pó
um monte de papéis
levados pelo vento.

Fecho a porta.
Busco o isqueiro
e mais uma vez,
a luz das faísacas
não se faz fogo.

Tudo parece gasto
e mal cuidado.

O tapete sujo é o espelho dos nossos caminhos.

Aqui dentro, passou o tempo

lá fora, tudo é barro,
ou pó levado ao céu pelo vento.

O mesmo que apaga o fósforo.

2-12-2006

Inveneneiamimmes

Mordeu-me um certo cansaço.
Até outro dia,
nem sabia que ele era um bicho,
uma espécie de demônio.

O veneno que agora me lacera a carne
foi o fruto de um beijo.

Me levaram as forças.

(… continua)

Queria encontrar um ombro amigo,
que pudesse me dizer do que a vida é feita.

Estou cansado,
fui mordido por mim mesmo.

dicionário amoroso


Bandeiras

A palavra que encerra tantos punhais: possibilidade.

As dores do amor

Descoberta arqueológica na Itália - Reuters
A imagem acima é um fato, descoberta científica anunciada na Itália em registro fotográfico da Reuters. Será só isso?

À margem

Kombi
Outro dia
à margem do rio
eu vi a lua
bandeirante.

O horizonte escuro exibia um astro brilhante,
nosso satélite.

Enquanto assobiava o propulsor a ar
fabricado em 1970, me invadia uma certeza:

A lua que se mostrava pouco acima dos prédios
ainda é a melhor metáfora do nosso tempo.

… princípio

Escutar é estar no outro
por isso, ser surdo para si mesmo
é o pior suicídio

Uma meia dúzia de fantasmas se debatem,
carregam correntes e levam o morto pelos cômodos

do passado

A pior morte é aquela que nunca termina
a lembrança dos tempos perdidos
é um estranho veneno

É a beira do precipício.

Eu sei que é Natal e que poucos me escutam,
por isso creio que vale repetir:
é preciso morrer para começar de novo.